sábado, 3 de outubro de 2009

Farsa Pré-Datada.


Tenho vivido de suposições plenas, certezas hipotéticas. Esse texto é, por exemplo, mais um compendio de pequenos atos teatrais que eu concluo dentro de um ônibus, de volta pra casa. E é então que eu descubro que tudo sempre esteve a um passo largo, a meros metros de mim. Tudo logo toma outra forma, pinta-se o mundo de outras cores - um tom indefinido, que chega sempre muito perto do azul mas é ainda meio cinza pra colorir o céu. Nada tem sido mais amargo que a quasificação das coisas. Se a mim fosse permitido o retrocesso, se houvesse um modo de recolher o já vivido e guardar de volta na ampulheta o tempo que roguei ao vento, se eu pudesse voltar à largada, aí sim, eu estaria a milimetros de cruzar a linha de chegada, de ser inteira fogos de artificio, eu estaria no podium outra vez. Porém, e isto é o que me assusta, leio as últimas palavras redigidas e não me encontro. Assusta-me isto que me possui enquanto escrevo, me atormenta o leque de possibilidades que dou aos que ousam me interpretar. O medo de não ser o que sou me invade pelos poros e só não toma conta de mim porque já há quem o faça diariamente, em grande parte do dia. Algo além de mim me segue e escreve aqui, um eu-lírico continuo que é maior que o autor. Eu receio que um dia isto passe a ser quem sou e então complique mais ainda o que não tem sido simples ou natural. Penso que tenho escrito {e bebido e falado e beijado e fodido e respirado} como um personagem, ou então sou eu que é assim e farsa é todo o resto {?}

2 comentários:

Raisa Bastos y Rodrigues disse...

Texto cuspido em março deste ano. Encontrei entre os rascunho e não resisti enquanto o 'publicar postagem' me fitava tão tentador... Tá aí. Mas eu preciso dizer que ODEIO a anacronia de minhas farsas pré-datadas.

Oi?

Hilário Ferreira disse...

Lembro do meu orientador de monografia que sempre citava Clarice quando perdia algum objeto, alguma coisa ou alguma palavra:
"Se eu fosse eu, onde o teria colocado?"

Lilith

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25 anos de sol em leão. queria voltar ao tempo em que era cool escrever letra de música no perfil / cozinha, escreve, pratica boxe e é jornalista nas horas vagas / acha que "transtornada" é um nome muito bacana para quem tem TDAH, eu tenho.