quarta-feira, 29 de abril de 2009

Texto-Voador-Não-Identificado.

Reza a lenda narrada por bocas alheias a mim e às minhas verdades que eu tenho andado alheia às ruas, à vergonha, aos códigos escritos tão antes de mim - tão velhos, tão decrépitos que eu, sinceramente, não sei bem se as línguas que hoje me chicoteiam não cuspiram desprezo e encharcaram de vergonhas os tais códigos, pelas mesmas tais ruas. Nada disso, porém, diz respeito ao que eu considero essencial no que me torno e que sempre fui; isto é tudo muito delas, não me diz respeito. Por entre as linhas da lenda que traçam em hipérboles que montam a partir do que vivo, lê-se mui clarito que eu não vou mudar, que eu não vou crescer porque não é o que busco. Porque estou sempre tão ocupada em ver e alardear o que me fazem, tão preocupada em provar ao mundo que, das coisas que eu fiz, não temos culpa eu ou as minhas vontades, é culpada tão somente a mídia, por onde escapam as verdades que supõem como minhas, tão metida em me des-culpas que não paro pra ver que, realmente, eu sou algoz de mim. Rá, piada. Não é questão de méritos, é só sobre o que se faz necessário, sobre eu imersa em minha parte podre e indelével, em meus erros, em meus litros de lágrimas. Tudo duro demais, frio demais, até que eu entendi, enfim, que se muito vale o já feito, mais vale o que será, sabe? Então vieram semanas de plenitude, sensatez e limpeza, juízo encaixado no compartimento correto e sendo efetivamente utilizado. Ainda sim era tudo duro, frio, só e eu me cobria de outras tantos entedimentos e é alicerçada destes últimos que me dou ao luxo de tirar meus olhos de mim, pedir que minhas mãos parem de tecer minha confissão e usá-los - mãos e olhos - pra mirar e lançar as pedras que eu levo comigo. Hoje, realmente, eu estou inteira me afogando em minha mágoa, remoendo minha raiva e não-entendendo como alguém que não me conhece pode me ajudar. É só por isso que eu choro, é só esse ódio que sinto. Não sou raza ao ponto de mergulhar e aprofundar-me tanto ao ponto de conhecer todas as minhas ondas, todas as moléculas de minha consciência em tão poucos dias, é por isso que não me ajudo mais. Então como pode alguém que nunca viu a MIM sem as crenças que criou sozinho sobre MIM pode agora achar que pode me fazer enxergar alguma coisa? Como pode você, doce irmã, tão metida em resolver a sua vidinha avessa, pode gastar tão belas frases de efeito em meu favor? Não, muito obrigada. Pegue seus livros de auto-ajuda, sua imensa verdade pobre e suas certezas tolas e empregue-as todas na SUA frustração. Um dia, porém, escreva um livro sobre mim, e eu o lerei aos setenta e não sentirei inveja de ninguém que esteja ao mundo vivendo e não existindo, e aqueles que o lerão hão de pensar: caralho, como essa menina viveu.

'...

segunda-feira, 27 de abril de 2009

muito pra nós dois.

Oh! sunday, monday, autumn pass by me

É que há muito já passou a madrugada das delícias e o dia seguinte costumava trazer as mesmas dúvidas, esse gosto de talvez que acabava por encobrir o gosto teu, o ranço de ilusão que me invadia e tomava como incerto cada sonho, todos os planos. Para além da minha janela fechada, as árvores não dançavam ao sabor do vento e não se desnudavam cobrindo o chão num manto dourado. O outono se anunciava eterno e estático. Como se eu estivesse presa numa armadilha do tempo, conduzindo meu corpo de volta ao primeiro dia cada vez que um novo sol teimava em nascer. As pessoas na fila do pão, a manchete dos jornais, encontrar você, deixar você saber, aceitar, deixar você ir, aceitar e as pessoas na fila do pão, na sala de jantar. Como se testassem meu sim, com um interrogatório, como em tortura. Como se a espera que eu vacile, que se apague em uma negação tudo quanto afirmo. Como uma chama que insiste em iluminar sem aquecer, tremulava em meu corpo a esperança que um dia você interrompesse o ciclo, então dançaríamos por sobre a linha pontilhada, por caminhos de pedras amarelas, por beiras de mar, por aí. O medo era o sopro no fogo brando; eu acordava e me sabia presa e só, dedo furado no tear, sono eterno, sem castelos, sem remorsos, só. Tantos vezes eu gelei frente ao que ainda me faz mover: meu cansaço; eu acordava e me sabia livre, alma indomável, mais asa que peito, no auge da minha vida e sem tempo algum a perder, repassando sem saudade as paixões que deixaram de acender meu tesão por respirar, madrugadas no escuro e com frio, implorando por avidez e coragem, repassando as cenas de nós num ângulo que não me entediasse, não me revoltasse, que me matasse de saudade pra não te lembrar escuro e frio, pra te lembrar qualquer que fosse o jeito, mas lembrá-lo até sempre. Acordei hoje e me sabia tua; não no desprendimento do 'ser' para 'ser de', não - como tanto se falou - sobre teu nome marcado em brasa no meu lombo. Eu só soube de mim sendo tua, na deliciosa certeza de que assim sou porque assim quero.



And sunday, monday, years, and I agree.


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Não valem dramáticos efeitos
Mas o que está depois
~

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Bem Lembrado.

'Aqui jaz um segundo ...

Um segundo passou e não volta. Cada milésimo é único, isto é inevitável. E o que eu disse se perdeu no vão das coisas que não voltam. No buraco negro do passado. Naquela terceira dimensão que nunca alcançaremos. Não que me agrade o efêmero, mas me assusta o estático. Um dia alguém disse que 'preferia ser uma metamorfose ambulante'. Quem? Já não importa, faz tanto tempo mesmo ...'



Me foge à memória qual era, enfim, a circunstância, a motivação, o que é que passava tão rápido ao ponto de me assustar e brindar o que em mim celebra o movimento, a falta de rotina. Me foge também de qual boca essa frase fugiu pra vir bater em mim. Me assusta que, sendo o tempo tão [eterno e/porém] rápido, este texto se mantenha atual. Não me agrada a anacrônia crônica. Não me agradam as rupturas e o vento mecânico libertando os fios do meu cabelo. Dia desses eu não saí por causa do frio, hoje o tempo mudou... e eu não boto o pé na rua, não desligo o ventilador. O que? Já não importa, e que se dane mesmo o tempo... o tempo todo.



Raisa Andrade, 2006.


segunda-feira, 13 de abril de 2009

salvar como rascunho [?]

Como é, liberdade, vou ter que requentar o teu café? Vou ter que ninar tua amargura de não ser tudo que pinta, tudo que é? Já não faço muito abrindo teus olhos pro dia, lavando teu rosto em água fria e te sussurrando em segredo tudo que há de ser, tudo que será? Ah, liberdade, vê se dá um tempo; pois, se hoje o mundo é o avesso, a prisão é o que mereço pra poder respirar. E, ao próprio tempo: me conceda o prazer de uma dança e eu prometo não enrolar numa trança teus ponteiros a me cansar. Façamos assim um trato: eu de cá sigo meu passo e tu daí apaga o rastro das besteiras que eu contar. E eu vejo se deste modo vou mais alto como águia e corro longe do baixio das águas em que rompo, caio e fico. Vejo assim, ó vida, se me lanço perdida no céu que eu rabisco. Peço ainda ao espaço que não me negue quadros, não me rompa os laços, não se estenda muito, não me faça só. Pois da tristeza quero distância e da solidão que hoje me canta quero fazer fumaça, quero vê-la em pó. Eis que minha fé solúvel é o que sobra se até a minha esperança anda solta no vento que outra boca sopra. Não cede também essa sede de ver inteiro o que é só metade, as facas, os cortes e toda sorte de pedaços que eu poder angariar num abraço. E, mando avisar à estrada que o alcanço com o braço: você não perde por me esperar. Acho que vou pôr água no fogo e preparar um café novo que a liberdade precisa mesmo despertar.

terça-feira, 7 de abril de 2009

meu nome é Vaidade.




quando eu entro na história
o roteiro é só pra mim.
não aguento essa escória
que não quer me ver assim:
poderosa,
preciosa,
generosa até demais.

minha imagem dá o brilho
no cenário dos mortais



vaidade é pra quem pode
vai dizer que você não quer?


segunda-feira, 6 de abril de 2009

in-color.

Meus pés escavam caminhos de volta e enterram-se frente ao velho piano, enquanto eu ilhada em sonhos revivo em notas as bobagem de amor que ali, deliberadamente, deixei. Minhas mãos tateiam loucas a procurar essa fresta entre a confissão e o desabafo, porque é aqui que eu me rasgo. E vão ficando soltas as minhas partes, porém atadas a esta colcha de retalhos curta e quente. Peito aberto, eu tenho medo de tiros; porque percorrendo os remendos, há de se saber de mim o que eu desconheço - pontos fracos, alvos fáceis, sonhos altos. Porém, uma vez aberta a boca, fogem de mim todos os pudores e os receios, e eu posso ser. Tenho sido o que digo e não o avesso - que eu acorde para ser o que me torno, que as horas não me batam sem que eu aprenda. Cito-me, capto o que ainda me cabe do que fui nos primeiros tecidos incluídos. Talvez encaixem melhor em meus vazios as peças rotas e quentes do que esta novidade fria que eu recorto, manipulo e apresento. Continuo talhando em minha própria testa o aviso cordial, o grito do espírito, a certeza plena de que eu não sou um anjo louco, uma benção torta. Minhas asas sem pena de homens, eu experimentando as flores em janelas diversas, desperdiçando lábia, língua e face. Louca e torta. Regresso ao início e teclas pressionadas vêm me soar e bater, sem carinho ou coberta, sem sentido. Este novo trecho que alonga o que me esquenta, talvez se exponha tão simbolista que não estejam nítidas as colorações e contornos. E, ao passo que você me vê em arco-íris, eu quero tela limpa, revistinha de colorir.

estou falando grego com sua imaginação.
E eis que, menos sábios do que antes,
Os seus lábios ofegantes
Hão de se entregar assim:
Me leve até o fim








dois a rodar

mas se era só por sofrer pra cantar,
pra sofrer por cantar
eu te entrego essa minha canção:

e éramos dois a
rodar e rodar e rodar e rodar.



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talvez um dia saibamos entender-nos,
como entendem de música os nossos pés.
... aos tropeços, mas leves e melodiosos ...
porém hoje é muito de alma
e aí eu só 'sei lá'.
sabemos ~


/só bobagens fugidas de um piano.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

carta ao Tom.

Ai quem me dera hoje não ser poeta, meu amigo, e poupar meus suspiros do louvor infindo às belas canções, aos lindos poemas, às doces frases de amor. Lá ao longe, março despede-se sem sinal de suas águas, meu coração adentra à estação e ele inteiro é outono: nada de cores ou promessas. Amigo, eu te queria ao meu lado sentado ao piano, viajando outra canção comigo, me cantando o amor demais. Não sei se me explico bem, é que eu já mal me entendo. Outra noite eu te contei de como andavam bambas as minhas pernas e quantas regras minhas eu violei. Violo porém esta confidência dizendo-te apenas que nunca foram tão firmes os meus passos e as minhas mãos não tremem mais. Apenas eu sei o que é acostumar-se à clausura das minhas próprias lembranças e desejos. Tanto que não quero estar livre, meu bem. Mas acontece que, enquanto ele segura minha mão e prende minha alma, minha boca canta só e meu corpo é ímpar, é acaso e não sorte. Eu devia me pôr à vitrine, com preço, condições e manual. Porém, sempre que me aparece comprador, monto meu sorriso de quem já tem dono, não fecho contratos, recuso encontros, não almoço no Amado, não retorno ligações. É uma vidinha cacete, eu sei. É tão injusto pra nós dois, a gente não segue a vida, não desenrola os sonhos, não nada. Ele diz que qualquer dia abre o peito pra outra e blá blá blá frases feitas blá blá qualquer outra exceto eu. Às vezes creio que ele escreve pra comprar as idéias que me vende e isto é engraçado. Eu enlouqueço, faço que vou chorar, {não} choro, re-enlouqueço, firo meu orgulho pra depois deitar, lembrar e sorrir. Rio-me mas ando tristinha. Qualquer dia ele cansa e acorda com sorrisos pra outra ... se ainda houver em minha testa uma placa com o nome dele quando tudo isso acontecer, onde enfio meu orgulho e planos? Onde eu enfio meu peito? Onde eu me enfio, hein? E esse amor, coomfãs?


É, meu amigo, só resta uma certeza:

é preciso acabar com essa tristeza
é preciso inventar de novo o amor.

Vou mudar de canção:

Você sempre me diz que é falso meu amor, que os beijos que lhe dou não tem nenhum calor, que eu sempre fingi querer mas não lhe quis, que o meu, que o nosso amor com outros dividi. Você não tem razão! Fala por falar ... Porque meu coração há muito que é seu. Na vida que eu vivi, nos sonhos que eu sonhei, no céu, na terra, enfim, eu sempre lhe encontrei.

Lilith

Minha foto
25 anos de sol em leão. queria voltar ao tempo em que era cool escrever letra de música no perfil / cozinha, escreve, pratica boxe e é jornalista nas horas vagas / acha que "transtornada" é um nome muito bacana para quem tem TDAH, eu tenho.