Traçou um perfeito círculo num papel laminado em prata. Pegou a tesoura e foi cortando, cuidando pra que não ficassem arestas, rebarbas, vacilos; deslizava o objeto cortante como se ele tão somente fosse capaz de seguir o tracejado, sem agredir o papel, por assim dizer. Seguia com o esmero de quem sabe estar realizando uma das mais belas obras de sua infinda existência, quiçá a de maior brilho, beleza, magia, mistério. Lembrou-se então de um antigo feito seu, assaz belo, porém inacabado; um papel azul de um escuro sem fim, salpicado por um sem número de pontinhos de luz que sorriam [só pra raros]. Colou então seu novo projeto, colou com uma desses adesivoss que desgrudam sem danificar, afinal, era apenas o teste. Mas era de um brilho imenso, era tamanha beleza, era pura magia e mistério, era tanto que, não havia dúvidas, precisava sê-lo por todo o sempre. Agora, entregue aos cuidados do firmamento, a Deusa a batizou: Lua.
Capítulo II, das Metades (Eclipse Oculto)
Eram dois. Duas metades? Talvez. O fato é que eram só os dois e um silêncio ensurdecedor. Ele, perdido em seus próprios pensamentos. Ela, tentando, a qualquer custo, ouvir as palavras que ninguém ousava dizer. Era de um vazio ... E, talvez por não ter o que dizer, mas muito incomodado com o silêncio mordaz, ele apontou paro céu e disse, pau sa da men te: vê lá, hoje ela não quis ser vista em plenitude; ainda assim ... é sua'. Ela, encantada e aflita, permanecia calada, o que poderia dizer? Ele balbuciou mais palavras soltas, um eu te amo e qualquer coisa sobre inocência e burrice, qualquer coisa que tornou o silêncio, antes perfurante, agora, preferível. E a lua lá, depois de guiar navegadores e andarilhos, organizar oceanos, inspirar poetas, agora preenchia o vazio dos amantes que só sabem amar pela metade.
Capítulo III, de Galileu
E, no céu de Ícaro, a lua ainda brilha. A Deusa, mãe generosa, entregou sua criação aos homens. Esses, julgando-se donos do que só podem contemplar, presenteiam suas [e]namoradas como se fosse a lua um frio diamante. Essas, contentando-se em apenas contemplar o que a elas pertence, deixam-na no céu e esperam, aflitamente, que a mesma se encha de graça. Dos galanteios à corrida espacial: um passo. E, a passos livres de gravidade, pisaram na lua, fincaram bandeiras trêmulas, profanaram com ciência e ceticismo o que fora um dia dos errantes, dos poetas, dos que amam. Hoje, ela apareceu cheia de si, cheia de ser só um pedaço de papel prateado no céu.